sábado, 9 de novembro de 2013

Benfica 4 - 3 Sporting, a.p.-Taça de Portugal


Segue o Benfica, cai o Sporting, mas a história deste 4-3 é tão maior do que isto! Num jogo surreal, a confirmar a tradição festiva dos grandes de Lisboa em jogos a eliminar, houve de tudo: brilho, erros de jogadores e de arbitragem, polémicas, momentos de génio e um frango de dimensões bíblicas. A história dos dérbis ganhou mais um episódio eterno, numa peça em três atos que não coube em 120 minutos.
O jogo em que Cardozo cimentou o estatuto de figura central deste Benfica reforçou, também, o lugar do paraguaio na história dos dérbis. O hat-trick desta noite, genuíno, depois do falso hat-trick de há um ano, deixa-o em lugar cada vez mais destacado no panteão dos marcadores, com 12 golos ao Sporting. Mas esta foi, também, a noite que permitiu a Jesus confirmar, no organizado primeiro ato, as virtudes da fórmula-Atenas, antes de a fragilidade defensiva nas bolas paradas precipitar a equipa para o atabalhoado segundo.
Do outro lado, o contraste foi absoluto: o Sporting mais personalizado das últimas épocas voltou a sublinhar identidade e ambição. Ao contrário do Benfica, foi uma equipa com percurso de menos a mais. Mas, como na derrota do Dragão, começou e acabou a pagar o preço da imaturidade com ofertas em momentos chave. Depois, não hesitou em ir à procura da felicidade, num momento em que o jogo parecia tê-lo atirado num poço sem fundo. E saiu de lá pelo próprio pulso, com três substituições inspiradas de Leonardo Jardim a fazerem-no levar o jogo para prolongamento, quando o dérbi partiu ao meio e se tornou irremediavelmente louco.

Primeiro ato

Chame-se 4x3x3 ou 4x1x4x1, o figurino ensaiado pelo Benfica com o Olympiakos, só com Cardozo em ponta e meio-campo reforçado, teve papel preponderante numa primeira parte dominada pela equipa de Jorge Jesus. Os primeiros minutos, com o Sporting a ter bola mas não espaço, definiram a superioridade encarnada na luta a meio-campo, onde Rúben e Enzo permitiam a Matic jogar na sobra, e anular a colocação de André Martins na meia direita, o espaço onde tinha feito tanta mossa a Cortez e Garay no dérbi de Alvalade.
Mas, tal como na derrota com o FC Porto, o Sporting agitou as águas oferecendo um golo à passagem do 10º minuto: Cardozo foi astuto na cobrança de um livre frontal – mas uma barreira bem feita não permitiria a passagem da bola por ali. O Sporting acusou o golpe, e demorou dez minutos a chegar perto da baliza de Artur, e outros dez a ganhar o primeiro canto.
Por essa altura, Rúben Amorim, que estava a ser a chave para o controlo a meio-campo, já tinha visto amarelo, diminuíndo a intensidade da pressão sobre Adrien. Coincidência ou não, o Sporting chegou ao empate pouco depois, num lance em que a defesa do Benfica parou para (sem razão) pedir fora de jogo de Montero e Capel concluiu em grande estilo um cruzamento perfeito de Wilson (37 minutos).
Mas, novamente como no Dragão, o Sporting desperdiçou a injeção de moral logo de imediato, com duas perdas de bola em zona proibida. Na primeira, Enzo serviu Gaitán na esquerda, para outro cruzamento perfeito, que Cardozo finalizou à matador, de cabeça (41 minutos). Na segunda, Gaitán ganhou a bola a William Carvalho, lançou Rúben Amorim, que serviu Cardozo (estava ligeiramente adiantado no momento do passe) para um remate de primeira que não deu hipóteses a Patrício (44). 3-1 e ponto final no jogo. Ou assim teria sido, numa noite normal.

Segundo ato

O segundo ato da partida coincidiu com o crescimento de Adrien e com a perda de influência de Rúben Amorim, ainda antes de ser forçado a sair por lesão. E preste-se justiça à convicção com que o Sporting decidiu mudar a história do jogo, mesmo antes de este lhe dar sinais encorajadores.
Já depois de uma queda de Montero na área (53 minutos), foi de Adrien, aos 62 minutos, a bomba que obrigou Artur a uma grande defesa para canto. E, pela sexta vez em menos de dois meses, a defesa à zona do Benfica deixou-se surpreender pela entrada de rompante de Maurício, a fazer o 3-2 no minuto seguinte. Pouco depois, um choque violento entre Adrien e Rúben Amorim obrigou os dois a receberem assistência fora dos relvados. Adrien voltou, Rúben não. E foi um pouco o que aconteceu às respetivas equipas: o Sporting manteve o ascendente, o Benfica foi incapaz de segurar o meio-campo, com a entrada de Ivan Cavaleiro a deslocar Gaitán para a zona central.
Leonardo Jardim acreditou, injetou dinâmica na equipa com a entrada de Carrillo, mudou-lhe o figurino para 4x4x2 com a entrada de Slimani, e reforçou-lhe a ousadia com a entrada em cena eufórica de Carlos Mané. O jogo ficava totalmente partido, e em apenas três minutos o Benfica teve duas oportunidades claras (Markovic à trave, e Patrício a negar o quarto a Cardozo com uma intervenção milagrosa), antes de Slimani acertar no poste. Descontrolado, sedutor, o dérbi pedia para não acabar já. Dito e feito: no segundo minuto de compensações, um livre cobrado por Adrien voltou a embaraçar a marcação defensiva do Benfica, permitindo a Slimani a cabeçada vitoriosa e dando aos adeptos mais 30 minutos de puro prazer.

Terceiro ato

O pequeno intervalo permitiu ao Benfica estancar o desnorte e recomeçar do zero. O jogo tornava-se épico, um hino à resistência ao cansaço. Por esta altura, com a entrada de Lima a acentuar as roturas, já não havia ordem em campo, nem tática que decidisse um jogo cada vez mais exposto ao desgaste e ao erro. E, injustamente, foi o mais grosseiro dos erros, o mais amador dos golos, a decidir um dérbi digno de reis. Patrício, que tinha sido herói e voltaria a sê-lo, sofreu um dos golos mais feios de toda a carreira, depois de um cabeceamento no chão de Luisão, e de um lançamento lateral que percorreu toda a área em carambola imprópria para os distritais (98 minutos).
Ainda não era o fim: faltava o pretexto para Duarte Gomes reforçar protagonismo, com razão de queixa para o Sporting, num lance não assinalado de pénalti contra o Benfica (mão de André Almeida a cruzamento de Carlos Mané, aos 108) e uma oportunidade clara para cada lado, com Slimani a cabecear ao lado (109), e André Gomes a acertar no poste (111), ainda antes de Rojo completar a história do dérbi com a expulsão. Emoções a mais para caberem em duas horas mais descontos. O que vale é que dérbis como este têm toda a eternidade para serem discutidos.
Por Nuno Madureira  
 

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